Ferritina: Conceitos
Um resultado elevado do exame Ferritina pode nos levar a pensar que há um excesso de ferro no paciente.
No entanto, dosagens de Ferritina elevada, nem sempre é excesso de ferro.
Como vimos na matéria sobre Regulação do metabolismo do Ferro, à medida que ocorre necessidade de íons ferro, estes são mobilizados dos estoques (Ferritina) para suprir esta demanda, além de outros mecanismos de regulação.
Além disso, essa proteína é funciona como um reativo de fase aguda positivo, isto é, em situações inflamatórias e/ou infecciosas, ocorre aumento da expressão da Ferritina.
+Regulação do metabolismo do Ferro.
No caso clínico de hoje, vamos discutir esta correlação entre a Ferritina e o Ferro que pode confundir a interpretação de exames laboratoriais.
Caso clínico
Uma criança com 1 ano de idade, diagnosticada com Síndrome de Pierre-Robin ao nascimento, foi internada por desnutrição grave.
Foram solicitados exames hematológicos, bioquímicos, imunológicos, de urina, culturas microbiológicas, dentre outros.
A seguir, discutiremos a correlação dos exames principais que chamaram a atenção do analista clínico.
Exames – Hemograma
A paciente apresentou um hemograma (Figura 01) sem alterações nas séries vermelha, branca e plaquetária.
Exames – Cinética do ferro (Ferritina / ferro)
Avaliando a cinética do ferro (Figura 02) observamos um aumento na dosagem de Ferritina (1.375 ng/mL) que nos levaria a pensar que há um aumento dos níveis plasmáticos de ferro da paciente.
Contudo, a dosagem do ferro sérico mostrou-se próxima ao limite inferior (56 µg/dL), com índice de saturação de transferrina baixo (15,8 %) (Figura 02). O que corrobora com o quadro de desnutrição da paciente.
Portanto, o aumento da ferritina não se deve a elevação do ferro, e sim devido a um processo agudo inflamatório que a paciente apresenta (veja adiante).
Correlacionando o hemograma com a cinética do Ferro, observou-se que, por não haver diminuição estabelecida da deficiência deste metal, não houve alteração na eritropoiese, não havendo anemia (redução no número de hemácias, hematócrito e hemoglobina), nem microcitose (redução do V.C.M.), nem hipocromia (redução do C.H.C.M), nem anisocitose (aumento do RDW).
Estes são alterações hematológicas (anemia, microcitose, hipocromia e anisocitose) no hemograma características de ferropenia. O que não é o caso nesta paciente.
Exames – Coagulograma
Outro resultado que chamou a atenção é o Tempo de Protrombina (TP) e o Índice de Razão Normalizada (INR) no coagulograma (Figura 03).
Por ser uma paciente desnutrida, a deficiência de Vitamina K pode ser detectada através de alterações no coagulograma. E, como já é descrito na literatura, a redução dos níveis de Vitamina K altera os fatores II, VII, IX e X da coagulação. Por sua vez, o fator VII tem o menor tempo de meia-vida, sendo o fator que “sentiremos falta” primeiro.
Dessa forma, os resultados da paciente corroboram, apresentando aumento do TP e INR, sem alteração do Tempo de Tromboplastina Parcial ativada (TTPa).
Exames – Proteína C Reativa (PCR)
Por fim, destacamos o aumento nos níveis séricos da PCR (Figura 04) que também é um reativo de fase aguda positivo e que, assim como a ferritina, está elevada em quadros inflamatórios e/ou infecciosos agudos.
Conclusão
Nem sempre quando tivermos um paciente com elevação dos níveis de ferritina, se deve a excesso de ferro. Ao contrário, na rotina clínica, é mais comum encontrarmos situações em que a elevação da ferritina se deve a processos inflamatórios e/ou infecciosos agudos, uma vez que ela é um reativo de fase aguda positivo.
Referências e leitura complementar:
2 respostas
Gostei muito. Excelente a matéria e muito didática. Parabéns Dr. João Pita pelas suas informações sempre interessantes e úteis demais!
Obrigado pelas palavras. Eu que agradeço suas contribuições!